1. Os modernos fenômenos do Espiritismo têm atraído
a atenção sobre fatos análogos de todos os tempos, e nunca a História foi tão
compulsada neste sentido como ultimamente.
Pela semelhança dos efeitos, inferiu-se a unidade da causa. Como
sempre acontece relativamente a fatos extraordinários que o senso comum
desconhece, o vulgo viu nos fenômenos espíritas uma causa sobrenatural, e a
superstição completou o erro ajuntando-lhes absurdas crendices. Provém daí uma
multidão de lendas que, pela maior parte, são um amálgama de poucas verdades e
muitas mentiras.
2. As doutrinas sobre o demônio, prevalecendo por
tanto tempo, haviam de tal maneira exagerado o seu poder, que fizeram, por
assim dizer, esquecer Deus; por toda parte surgia o dedo de Satanás, bastando
para tanto que o fato observado ultrapassasse os limites do poder humano. Até as
coisas melhores, as descobertas mais úteis, sobretudo as que podiam abalar a
ignorância e alargar o circulo das ideias — foram tidas muita vez por obras
diabólicas. Os fenômenos espíritas de nossos dias, mais generalizados e mais
bem observados à luz da razão e com o auxilio da Ciência, confirmaram, é certo,
a intervenção de inteligências ocultas, porém agindo dentro de leis naturais e
revelando por sua ação uma nova força e leis até então desconhecidas.
A questão reduz-se, portanto, a saber de que ordem são essas
inteligências. Enquanto se não possuía do mundo espiritual noções mais que
incertas e sistemáticas, a verdade podia ser desviada; mas hoje que observações
rigorosas e estudos experimentais esclareceram a natureza, origem e destino dos
Espíritos, bem como o seu modo de ação e papel no Universo — hoje, dizemos, a
questão se resolve por fatos. Sabemos, agora, que essas inteligências ocultas
são as almas dos que viveram na Terra. Sabemos também que as diversas categorias
de bons e maus Espíritos não são seres de espécies diferentes, porém que apenas
representam graus diversos de adiantamento. Segundo a posição que ocupam em virtude do desenvolvimento
intelectual e moral, os seres que se manifestam apresentam os mais fundos
contrastes, sem que por isso possamos supor não tenham saído todos da grande
família humana, do mesmo modo que o selvagem, o bárbaro e o homem civilizado.
3. Sobre este ponto, como sobre muitos outros, a
Igreja mantém as velhas crenças a respeito dos demônios. Diz ela: “Há princípios
que não variam há dezoito séculos, porque são imutáveis.” O seu erro é
precisamente esse de não levar em conta o progresso das ideias; é supor Deus insuficientemente
sábio para não proporcionar a revelação ao desenvolvimento das inteligências;
é, em suma, falar aos contemporâneos a mesma linguagem do passado. Ora, progredindo a Humanidade enquanto a Igreja se abroquela em
velhos erros sistematicamente, tanto em matéria espiritual como na científica,
cedo virá a incredulidade, avassalando a própria Igreja.
4. Eis como esta explica a intervenção exclusiva
dos demônios nas manifestações espíritas:1
“Nas suas intervenções exteriores os
demônios procuram dissimular a sua presença, a fim de afastar suspeitas. Sempre astutos e pérfidos, seduzem o homem com ciladas antes de
algemá-lo na opressão e no servilismo. “Aqui lhe aguçam a curiosidade com fenômenos e partidas pueris; além, despertam-lhe a admiração e subjugam-no pelo encanto
do maravilhoso.“ Se o sobrenatural aparece e os desmascara, então, acalmam-se,
extinguem quaisquer apreensões, solicitam confiança e provocam familiaridade.
“Ora se apresentam como divindades e bons gênios, ora assimilam
nomes e mesmo traços de memorados mortos. Com o auxílio de tais fraudes dignas
da antiga serpente, falam e são ouvidos; dogmatizam e são acreditados.
- 1 As
citações deste capítulo são extraídas da mesma pastoral indicada no precedente,
e da qual são corolários. É a mesma fonte e, por conseguinte, a mesma
autoridade.
Fonte: “O Céu E
O Inferno” Ou A Justiça Divina Segundo O
Espiritismo - Allan Kardec -
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.