237. Entre os escolhos que apresenta a prática do
Espiritismo, cumpre se coloque na primeira linha a obsessão, isto é, o
domínio que alguns Espíritos logram adquirir sobre certas pessoas. Nunca é praticada
senão pelos Espíritos inferiores, que procuram dominar. Os bons Espíritos nenhum
constrangimento infligem. Aconselham, combatem a influência dos maus e, se não
os ouvem, retiram-se. Os maus, ao contrário, se agarram àqueles de quem podem fazer suas presas. Se chegam a dominar algum, identificam-se com
o Espírito deste e o conduzem como se fora verdadeira criança.
A obsessão apresenta caracteres diversos, que é preciso distinguir
e que resultam do grau do constrangimento e da natureza dos efeitos que produz.
A palavra obsessão é, de certo modo, um termo genérico, pelo qual se designa esta
espécie de fenômeno, cujas principais variedades são: a obsessão simples, a fascinação e a subjugação.
238. Dá-se a obsessão simples, quando um Espírito malfazejo
se impõe a um médium, se imiscui, a seu mau grado, nas comunicações que ele
recebe, o impede de se comunicar com outros Espíritos e se apresenta em lugar dos
que são evocados.
Ninguém está obsidiado pelo simples fato de ser enganado por um
Espírito mentiroso. O melhor médium se acha exposto a isso, sobretudo, no
começo, quando ainda lhe falta a experiência necessária, do mesmo modo que,
entre nós homens, os mais honestos podem ser enganados por velhacos.
Pode-se, pois, ser enganado, sem estar obsidiado.
A obsessão consiste na tenacidade de um Espírito, do qual não consegue desembaraçar-se a pessoa sobre quem ele atua. Na
obsessão simples, o médium sabe muito bem que se acha presa de um Espírito mentiroso
e este não se disfarça; de nenhuma forma dissimula suas más intenções e o seu
propósito de contrariar. O médium reconhece sem dificuldade a felonia e, como se
mantém em guarda, raramente é enganado. Este gênero de obsessão é, portanto,
apenas desagradável e não tem outro inconveniente, além do de opor obstáculo às
comunicações que se desejara receber de Espíritos sérios, ou dos afeiçoados. Podem
incluir-se nesta categoria os casos de obsessão física, isto é, a que consiste nas manifestações
ruidosas e obstinadas de alguns Espíritos, que fazem se ouçam, espontaneamente,
pancadas ou outros ruídos. Pelo que concerne a este fenômeno, consulte-se o
capítulo Das manifestações físicas espontâneas. (Nº 82.)
239. A fascinação tem conseqüências muito mais
graves.
É uma ilusão produzida pela ação direta do Espírito sobre o
pensamento do médium e que, de certa maneira, lhe paralisa o raciocínio,
relativamente às comunicações. O médium fascinado não acredita que o estejam
enganando: o Espírito tem a arte de lhe inspirar confiança cega, que o impede
de ver o embuste e de compreender o absurdo do que escreve, ainda quando esse
absurdo salte aos olhos de toda gente. A ilusão pode mesmo ir até ao ponto de o
fazer achar sublime a linguagem mais ridícula. Fora erro acreditar que
a este gênero de obsessão só estão sujeitas as pessoas simples, ignorantes e
baldas de senso. Dela não se acham isentos nem os homens de mais espírito, os mais instruídos
e os mais inteligentes sob outros aspectos, o que prova que tal aberração é
efeito de uma causa estranha, cuja influência eles sofrem. Já dissemos que muito mais graves são as consequências da
fascinação. Efetivamente, graças à ilusão que dela decorre, o Espírito conduz o
indivíduo de quem ele chegou a apoderar-se, como faria com um cego, e pode levá-lo a aceitar
as doutrinas mais estranhas, as teorias mais falsas, como se fossem a única
expressão da verdade. Ainda mais, pode levá-lo a situações ridículas,
comprometedoras e até perigosas.
Compreende-se facilmente toda a diferença que existe entre a
obsessão simples e a fascinação; compreende-se também que os Espíritos que
produzem esses dois efeitos devem diferir de caráter. Na primeira, o Espírito
que se agarra à pessoa não passa de um importuno pela sua tenacidade e de quem
aquela se impacienta por desembaraçar-se. Na segunda, a coisa é muito diversa.
Para chegar a tais fins, preciso é que o Espírito seja destro, ardiloso e
profundamente hipócrita, porquanto não pode operar a mudança e fazer-se
acolhido, senão por meio da máscara que toma e de um falso aspecto de virtude.
Os grandes termos — caridade, humildade, amor de Deus — lhe servem como que de carta
de crédito, porém, através de tudo isso, deixa passar sinais de inferioridade,
que só o fascinado é incapaz de perceber. Por isso mesmo, o que o fascinador mais
teme são as pessoas que veem claro. Daí o consistir a sua tática, quase sempre,
em inspirar ao seu intérprete o afastamento de quem quer que lhe possa abrir os
olhos. Por esse meio, evitando toda contradição, fica certo de ter razão
sempre.
Allan Kardec – “O
Livro Dos Médiuns” Feb.
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